A FLORESTA DAS ÁRVORES CENTENÁRIAS





A Floresta das Árvores Centenárias
Contos para pequenos
                                                                                                                      Gideon Rosa*

                                                                                                     

         Era uma vez uma bruxa chamada Risoleta. Ela vivia próximo a um pântano no centro de uma floresta escura. Ela e sua vassoura estavam velhas e, por isso,  já não voavam tanto como antigamente. Mas sempre que podiam, elas saíam por entre as árvores escuras e úmidas catando folhas, flores (sem cor) e coletando insetos para fazer as poções mágicas.

       Nos limites da floresta havia uma aldeia onde circulavam muitas histórias sobre Risoleta. A velha bruxa era o assunto preferido das conversas, principalmente para amedrontar as crianças, que morriam de medo dela. Os adultos também tinham medo, mas não confessavam.

     Corria o boato de que Risoleta olhava uma pessoa e caso não simpatizasse, transformava-a numa estátua de pedra. Para sempre.

          Dizia-se que no fundo da casa dela havia um quintal cheio de estátuas de animais e, também, do bicho gente. Todas em pedra-sabão.

           Risoleta vivia tão isolada que ninguém havia se dado conta de que ela já não era tão jovem e não voava assim tão longe como antigamente, tampouco oferecia perigo.

       Hoje, no entanto, Risoleta reuniu todas as suas forças, e abriu as janelas de sua casa sombria. Hoje era o dia da deusa protetora das bruxas. E todos os anos nesse dia havia uma reunião com as bruxas de toda a Terra. E nessa reunião haveria um concurso para que todas pudessem testar os seus mais novos feitiços. 
          Fazer um grande feitiço era a condição para continuar sendo uma bruxa respeitada e temida.

         Por isso, Risoleta tirou a poeira de sua vassoura, empinou-a na frente da casa e fez um enorme esforço para sair voando em busca dos ingredientes para uma poção nova que apresentaria mais tarde. Ela precisava de algo muito especial: um minúsculo e raro sapo que só vive na Mata Atlântica, e bem próximo de jequitibás e não da água como os demais sapos.

          Além do sapo-miniatura, ela precisava de uma mucunã, e, também, de um dente de cobra macho. O que ninguém sabia é que ela tinha um plano secreto: transformar as colegas bruxas em estátuas de pedra (talvez pedra-sabão porque ela adorava essas pedras) e, finalmente, ser a única bruxa do planeta.

         Mesmo sem o vigor de outros tempos, Risoleta resolveu voar um pouco mais para mais além do pântano e ficou surpresa com o que viu. Não havia mais a Mata Atlântica, os rios estavam escuros de poluição e onde, antes, havia árvores frondosas, agora, só havia capim e muitos animais pastando. Risoleta ficou furiosa porque sem a Mata Atlântica ela não iria encontrar o mini-sapo nem mucunã e muito menos o dente de cobra macho.

         Ela olhou aquela paisagem desoladora feita pelos homens e estremeceu de raiva. Ela bufou de raiva. Puxou sua varinha mágica e disse num rompante:

        - De hoje em diante eu prometo que serei a vingadora da Natureza. Tudo vai voltar a ser o que era! Não tenho tanta força, mas minha varinha mágica ainda funciona.

          Risoleta usou as poucas forças e deu uma revoada em círculos com sua vassoura. Ela foi surpreendentemente tão rápida que a coitada da vassoura começou a soltar fumaça. Enquanto corria em círculos Risoleta ia brandindo sua varinha de condão  em todas as direções. O céu escureceu de repente, raios e trovões eram vistos e ouvidos o tempo inteiro, vindos de todas as direções.

          Depois de muito voar em círculos com sua vassoura, Risoleta, exausta, sentou-se numa pedra bem no alto da montanha e contemplou o que tinha feito.

          E ficou muito satisfeita. No lugar dos rios escuros de águas poluídas, agora corriam  caudalosos rios de cachoeiras e águas cristalinas e no entorno centenas de riachos cheios de piabas e berés. Alvinhos e limpos. Ah, tinha também pitus, gajés, jundiás, acaris.... E para guardar tudo isso, Risoleta fez surgir novamente a Mata Atlântica original. Era uma floresta de árvores gigantescas e cheia de bichos de todo o tipo, até juparás e macucos ressurgiram. As árvores brotavam da terra e subiam bem alto no céu até quase não se poder mais ver as copas.

         Sem querer, e com seu rompante de raiva, Risoleta havia construído outro mundo. Bem, agora era ela Risoleta, a defensora da Natureza. Pássaros e flores de todas as cores e formas habitavam a Mata Atlântica novamente. Aquela era uma verdadeira floresta de árvores centenárias, com orquídeas das mais diversas cores.

          Já era noite alta, a lua brilhava no meio do céu da madrugada, mas Risoleta continuava admirando o trabalho de sua varinha de condão. Ela até esqueceu a reunião das bruxas. Risoleta estava gostando de criar coisas. E, somente depois de contemplar por muito mais tempo tudo o que havia feito é que ela se lembrou da pequena aldeia e do perigo que aquelas pessoas representavam para a floresta. Aí, novamente, Risoleta brandiu sua varinha mágica e resolveu esconder todas as árvores, rios e riachos, e todos seus bichos. Tudo estava lá, mas invisível aos olhos dos homens e visível somente para os seres mágicos que habitam as matas.

         Talvez, um dia, novamente, ela pudesse encontrar, os minúsculos sapos, as mucunãs.... quem sabe...mas uma coisa era certa, Risoleta agora se sentia outra e havia perdido completamente o interesse em fazer poções mágicas. E transformar pessoas em estátuas de pedra-sabão nem pensar.

- Sabe, eu acho até que vou reviver todas as estátuas de pedra que fiz durante o tempo em que eu não via a beleza da mata como eu vejo agora!

              E saiu voando devagar em direção ao seu quintal.


*Gideon Rosa é jornalista e teatrólogo