08 DE MARÇO - DIA INTERNACIONAL DA MULHER





08 de março


PARABÉNS ÀS MULHERES que com amor, carinho e determinação nos ensinam o caminho para a construção de um mundo onde a tolerância prevaleça sobre a ignorância, onde a paz se sobreponha à guerra e onde o amor esteja presente em todas as ações humanas.



PENSAMENTOS DE ESCRITOReS ALITANoS  SOBRE A MULHER




I -  TICA SIMÕES


No Dia da Mulher, uma homenagem de Maria de Lourdes Netto Simões
a Valdelice Pinheiro





A Voz de uma mulher grapiÚna – valdelice Pinheiro

 


Maria de Lourdes Netto Simões


Em 2002, publiquei a Expressão Poética de Valdelice  Pinheiro,     resultado da pesquisa  realizada no âmbito da orientação de iniciação científica na Universidade Estadual de Santa Cruz. O estudo ocupou-se do acervo inédito de   Val, como carinhosamente a chamávamos.  A sua Voz nos foi revelada através    de  poemas, crônicas, textos filosóficos, desenhos.  Foi um trabalho extremamente prazeroso e necessário; forma de dar maior visibilidade  à expressão daquela   mulher grapiúna, nascida no chão do cacau.
Aqui, como um convite, trago  uma pequena mostra da   sua expressão poética,  publicada pela EDITUS. 



                                                                       Não há tempo para o poema e o poeta dura e um dia morre no corpo de sua carne, para ser apenas o instante,
 maior que o tempo, no corpo de seu verso. (p. 30)


Professora e filósofa, Valdelice Pinheiro afirmava não querer simplesmente fazer poesia, mas ser poeta no gesto diário de viver.


Ninguém me mande deixar nada, nem me obrigue às construções convencionais – não quero fazer parte do passado. Por isso escrevo. A poesia não fica, a poesia é . Nenhum poeta fica no que escreve, porque todo poeta é o que escreve. (p.16)

Nascida em Itabuna (Bahia), tendo vivido muito ligada ao campo e às roças de cacau, a sua poesia é perpassada por essas vivências. 


Eu vim
de noites úmidas,
quando as sementes
fecundavam
o corpo virgem
da mata.
Eu vim
da branca paisagem
de pequenas flores
germinando ouro
no ventre
dos cacauais.
E acordei na manhã
dos deuses,
no mundo
do chocolate. (p.65)


Eminentemente filosófica desde o seu processo de enunciação até a concretude da sua formulação,  muitas vezes antecede o processo de produção uma  reflexão filosófica.  A presença de Deus na sua obra não se faz por crença religiosa, mas por uma postura filosófica e de fé; assim,  está na base do seu fazer poético.
Nesse sentido, textos filosóficos são verdadeiras matrizes de poemas  ou de prosas poéticas:


No começo não era o caos, o nada, mas a Unidade, a Perfeição, a ordem absoluta no Todo, no Em Si (primordial), eterno. 
A Perfeição absoluta explode. E a explosão é do espírito, da consciência, para criar-se a si mesma.
Deus, portanto, essa Existência Anterior, não criou do nada, mas CRIA de si mesmo, explodido. Criar é explodir-se no Ser. (p. 132)


Filtradas pela palavra poética,  observações vivenciadas são universalizadas em temática reflexiva,  recorrente às  questões relacionadas a valorização da natureza, desigualdade social, liberdade, simplicidade do existir, amor universal, necessidade da igualdade entre os homens.


Os vagalumes desta noite
iluminam minha noite
e me emprestam
sua luz e suas asas.
Então, feliz,
a estrada clareada,
eu vou te ver. (p.98)


O repertório que utiliza denuncia a sua objeção ao mando, às desigualdades sociais próprios do contexto  grapiúna, da conquista das terras do cacau, do desbravar das matas, do mando dos coronéis, do poder do mais forte.


Nem o homem
se escravize ao fruto,
nem o fruto ao homem,
mas sejam ambos
a alegria da terra.

                                                                  (p.94)

Termos fortes e duros não fazem parte do seu  repertório,  pois "é preciso vencer o pudor da palavra, o pudor da verdade como poesia exata". Aliás, neste sentido Valdelice diz ter o lirismo covarde dos burgueses: “revolucionária sentada, fumando tranquilamente [...] cigarro multinacional, comendo um frango defumado também multinacional [...] quer a linguagem desejando a Paz, a Justiça, a igualdade dos homens, mas  [...] tremendo de medo daquele que virá com fuzil na mão, buscar [...] a prestação de contas, marginal ou patriota!”


Entre a inocência
dos dedos do menino
e o revólver
na mão do assassino,
há sempre um espaço
de nada,
um trágico destino.
Nem escola,
nem casa,
nem terra,
nem pão.
Quando a inocência
dos dedos do menino
se quebra
na mão engatilhada
do assassino,
perde-se a paz,
porque um homem escapou
de seu menino.  (p.77)


A sua poesia é também expressão da sua esquizofrenia assumida. Admite isso,  entendendo-a como uma viagem. Nos processos de elaboração mental,  considera, ainda, as respostas do corpo aos reclamos da mente como somatização: “Tomar no corpo as porradas da mente...[...] O homem é um animal que se inventa e, inventando, se desconhece” (p. 145). Para Val, escrever é libertar-se.

Escritos de auto-interpretação são explicativos do seu processo poético e podem ser tomados como uma proposta de  teoria da poesia. O texto nasce do silêncio, diz a poetisa, de uma voz interior impulsionadora. Essa Voz (com maiúscula), diz ela, não “a simples voz, um som emitido pela competência do aparelho fonador, mas a Voz, a VOZ, aquilo que sem dúvida não me antecipa, mas é certamente o que me diz. A Voz... Esse silêncio que chega aflito, precisando do grito, tem que inventar o som...” (p. 136). 

O processo de surgimento do poema passa pela fase do que chama de “mundo das idéias”, fase essa expressada através de desenhos.  São retas, curvas, espirais que dão surgimento a inesperadas formas e em seguida ao poema.  Nesse instante, “a voz  tira a lógica, o juízo, desregula o comportamento do vocabulário” (id).  Assim nasce  o poema:


  Se a carambola
tivesse dedos
 tocaria Mozart.
 Certamente.


(p. 91)


O processo criador (termo que prefere a produtor) muito tem de arrebatador e inexplicável. É fruto da VOZ que “no poema ou no gesto, cria o ‘milagre’ humano... A palavra é apenas via, instrumento, acidente...”, quando o deslizar do lápis sobre o papel faz o desenho ser poema.






                                                                                                                      (p.116)



Assim, poesia e desenhos (rabiscos) expressam a sua forma de comunicar. Compondo um processo artístico que ultrapassa a palavra para uma comunicabilidade visual; a sua poesia brota dos rabiscos.  Dessa forma, arte pictórica e arte poética somam-se numa expressão que fala por várias linguagens. Poesia de versos curtos, tituladas ou não; rabiscos tracejados ou definidos, sempre em grafite, fazem o seu texto leve, visual, rápido, múltiplo. Fazem a sua poesia comunicativa e bela. A revisitação filosófica sobre temas que transcendem fronteiras faz  a sua Voz profunda, crítica   e questionadora. Universal.


Tica Simões é membro efetivo da ALITA




II -  SÔNIA MARON




PALESTRA PROFERIDA NA “CASA DA AMIZADE” -  ROTARY CLUBE  DE ITABUNA – Em 12.03.2013

Queridas amigas da Casa da Amizade, ala feminina do Rotary Clube de Itabuna.

      No mês de março de 1992, no limiar do ano dois mil, marco de um novo milênio, tive a honra de comparecer a este clube de serviço, na condição de convidada da minha amiga querida de ontem, de hoje e de sempre, Ivete Passos, quando presidente do clube seu filho Carlos Eduardo Passos, a fim de que, reunidas nesta Casa da Amizade,  pudéssemos refletir sobre a mulher, seu papel na família, na vida social, enfim, como símbolo dos valores mais caros de uma sociedade, no dia consagrado universalmente à mulher depois que o mundo despertou para a lembrança do episódio registrado no dia 8 de março de 1857, quando operárias da indústria têxtil, em Nova Iorque, promoveram manifestação em uma fábrica reivindicando redução do horário de trabalho que se estendia por 16 horas diárias e aumento do salário que correspondia a um terço (1/3) recebido pelos homens. Cerca de 130 mulheres, encerradas na fábrica, morreram carbonizadas. Apesar do brutal e criminoso incêndio, somente em 1910, na Dinamarca, por ocasião de uma conferência de mulheres, foi instituída a data comemorativa, celebrada bem mais tarde.
      Sensibilizada com o convite que se repetiu, em outro século, posso afirmar que, em nossos dias, a igualdade dos sexos é admitida e proclamada nos mais respeitáveis diplomas legais, embora ainda exista dissimulada repressão a cada conquista. A mudança social vem concretizando a evolução da mulher na vida de todos os povos, destacando-se representantes da firmeza, competência e sensibilidade femininas em todas as profissões e na direção dos três poderes que alicerçam a sociedade organizada. O processo contínuo de mudança social traz uma  brisa vivificante que apaga costumes e valores obsoletos e injustos, conduzindo a mulher a assumir cargos e encargos antes reservados aos homens com exclusividade. Passos importantes foram dados no caminho da igualdade de direitos. Cumpre observar que a  igualdade desejada, que conduz a mulher à tão sonhada equiparação, passa pela formação profissional preparando-a para a participação na vida social.
      Em nosso Brasil, a mulher atual encontra-se protegida pelo art. 5º da Constituição Federal: “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações”. Todos os direitos conferidos aos varões são por nós partilhados. E, obviamente, todas as obrigações.  Bem sabemos que, ainda hoje, para fazer valer o comando da Lei Magna, pagamos tributos bastante elevados... O trabalho feminino, em muitos setores, não atingiu o reconhecimento, nem a retribuição conferida ao labor confiado ao homem. E o labor, segundo Hannah Arendt, “assegura não apenas a sobrevivência do indivíduo, mas a vida da espécie” sendo a mulher a maior responsável pela segunda hipótese. Além disso, a mulher, quando decide ocupar o seu espaço como profissional liberal, funcionária pública, empresária ou qualquer outra ocupação que lhe permita ganhar o sustento com dignidade, vai ser testada para provar o seu mérito. É um permanente desafio. O seu caminho será mais longo em cotejo com o caminho reservado ao homem. Seja qual for o trabalho executado pela mulher, seja qual for o cargo ocupado na empresa pública ou privada, diplomata, militar, magistrada, arquiteta, professora, policial, costureira, faxineira, pouco importa o que faça, do trabalho mais rudimentar ao mais intelectualizado, encerrada a jornada diária, volta a envergar o  avental e ocupar-se das tarefas milenares de toda mãe de família. Mesmo que o uso do avental seja meramente simbólico, a diretriz da casa e da família são suas; os múltiplos problemas profissionais pendentes de solução, requerendo estudo e reflexão, vão permanecer em compasso de espera face às prioridades do seu verdadeiro mundo: fiscalização da alimentação, do asseio da casa, dos mantimentos, do rendimento escolar dos filhos; paciência e compreensão com os problemas de todos do seu universo familiar e muitas e muitas vezes é preciso esquecer a qualificação profissional e tentar suprir a falta da cozinheira, da costureira, da arrumadeira, da  lavadeira, do eletricista, do  encanador, da enfermeira. E o cãozinho da família, figurinha responsável pelo sorriso de todos? Quem fiscaliza a alimentação do bichinho, a rotina do banho e  as visitas ao veterinário? E sua majestade, o bebê? É o último citado, por ser o destaque maior, dono do tempo, das emoções, da alegria e da tristeza de todas as mulheres; filhos ou netos, mandam e desmandam na vida da mãe e da avó, alvo maior dos sonhos e planos da mulher, donos do seu sorriso, responsáveis por sua felicidade e realização plena. Quantas de nós, no recesso do lar, já fomos polivalentes ? É próprio da condição feminina, decerto em decorrência de um condicionamento cultural que não conseguimos afastar. Talvez as mulheres muito jovens ignorem as tarefas citadas, pois as mulheres de “prendas domésticas” são uma espécie em extinção, o que é uma pena. Se o ensino fundamental e médio excluiu do currículo “educação doméstica” e “trabalhos manuais”, a vida continua exigindo da mulher as mesmas tarefas, hoje terceirizadas, complicando o orçamento familiar.
Dir-se-ia mais cômodo e sensato permanecermos no trono de “rainhas do lar”, supostamente protegidas da vida lá fora, ocupadas com as tarefas românticas e dignificantes reservadas à mulher. Esta opção, no entanto,  seria retroceder ao tratamento conferido  à mulher pelo Código Civil de 1916, que incluía a mulher casada na categoria dos incapazes,  proibindo-a da prática dos atos vedados aos menores de 21 anos, pródigos e silvícolas. Somente com o advento da Lei nº 4.121, conhecida como Estatuto da Mulher Casada, de 27 de agosto de 1962, passou o dispositivo a ter nova redação desaparecendo a restrição. Os benefícios trazidos pela lei referida estendem-se à chefia da sociedade conjugal, hoje exercida pelo marido com a colaboração da mulher, no interesse comum e dos filhos, também restringindo o direito do marido de fixar e mudar o domicílio da família, concedendo à mulher o direito de recorrer à Justiça se a deliberação for em seu prejuízo.
Diversos outros dispositivos da lei civil que inferiorizavam  a mulher foram abolidos com lei nº 4.121 e modificações subsequentes, notadamente a redação do novo Código Civil, em vigor a partir de 10 de janeiro de 2002, Lei nº 10.406, com destaque para a lei Maria da Penha. Não serão citados para evitar uma abordagem excessivamente técnica e cansativa, que fugiria ao nosso propósito de um encontro ameno de amigas. Saliente-se, todavia, o estado de verdadeira orfandade legal  em que ficávamos com as normas da lei civil, que regula, é bom que se diga, “direitos e obrigações de ordem privada concernentes às pessoas, aos bens e às suas relações”. O antigo Código Civil, sendo de 1916, conservou todos os preconceitos e discriminações daquele momento histórico. Elaborado por homens e por homens conduzido todo o processo legislativo, é compreensível a conotação patriarcalista das normas referentes à família, casamento e direitos da mulher em geral. Em verdade, a mulher, àquela época, não participava da vida pública e somente excepcionalmente exercia trabalho lucrativo. Logo, da ausência de responsabilidades vem a incapacidade e desta a inferioridade em relação à posição do homem, no que toca aos direitos de ambos no casamento e demais aspectos da vida civil. Da independência decorre o ônus e assim tem que ser: bendito o ônus que nos dá a independência!
Se a lei civil discriminava a mulher, a lei processual penal não fazia por menos. O art. 35 do Código de Processo  Penal de 1940, que vigorou até bem pouco tempo, tinha a seguinte redação: “a mulher casada não pode exercer o direito de queixa sem o consentimento do marido, salvo se for separada ou se for contra ele”. Por se tratar de matéria penal, a Lei nº 4.121 não modificou. Somente com a Constituição de 1988 foi modificado o entendimento, à luz do art. 15 que afasta qualquer dúvida porventura existente: “todos são iguais perante a lei”.
Longa e sofrida tem sido a luta por nós empreendida para conquistar o respeito ao que somos como membros participativos e atuantes da sociedade. A mulher consciente do seu papel há de entender a responsabilidade como um prêmio à sua libertação e independência, efetiva colaboradora do homem sem abdicar da feminilidade e toda gama de encanto e fragilidade aparente que constituem o “eterno feminino”.
E a mulher atual? O que representa? Somos, em verdade, as mulheres do século XXI, que vivem um novo milênio. Se DEUS permitir, todas as representantes da Casa da Amizade aqui presentes viverão muitas décadas do século que se inicia, transmitindo às nossas filhas e netas os valores que cultuamos, preparando-as para a vida em sua plenitude e não apenas para a vida familiar. A mulher atual, que cada uma de vocês personifica, sabe que nossa presença é necessária em todos os segmentos da sociedade e nosso conhecimento indispensável nos mais diferentes cargos e funções públicas e privadas, que desempenhamos com a mesma eficiência e probidade que os homens e às vezes com mais brilhantismo. A responsabilidade é nossa que vivemos mais uma década de um novo século, coincidentemente um novo milênio, de destruir os últimos obstáculos para que se torne uma realidade palpável a igualdade de direitos.
Falamos, desde o início, no limiar de um milênio, de um novo século. E também falamos em dispositivos de lei que foram revogados para corrigir as discriminações absurdas impostas à mulher. Pois bem. Por que não revogar, em nossa mente, o castigo que nos foi imposto em um dos livros da Bíblia Sagrada, o Gênesis? – “O teu desejo será para o teu marido, e ele te governará...” Nossa dependência e submissão passam a pertencer ao inconsciente coletivo, que faz a captação de uma informação distorcida. A Bíblia, é evidente, não pode ser revogada. Nossas mentes é que devem ser trabalhadas no sentido de conferir outra interpretação, aproximada à leitura do versículo 18, do mesmo livro: “Não é bom que o homem fique só: far-lhe-ei uma auxiliadora que lhe seja idônea”. Pois é, minhas amigas. Uma auxiliadora, com o diz a Bíblia; uma colaboradora como diz a lei civil. Sempre ao lado do homem como mãe, irmã, amiga, filha, esposa, companheira, parceira na alegria e na dor. Usufruindo os mesmos direitos e partilhando os mesmos deveres.

Sônia Maron é membro efetivo da ALITA


III -  SIONE PORTO



DIGA NÃO À VIOLÊNCIA CONTRA AS MULHERES


Em termos de violência, as estatísticas das Delegacias Especializadas de Proteção à Mulher, desde 1985, têm demonstrado que as agressões, ameaças e estupros contra a mulher, vêm aumentando assustadoramente, em números preocupantes. A ONU acaba de denunciar que há um surto global de ataques contra a mulher. Sete em cada dez serão estupradas ou vítimas de violência ao longo da vida (Revista Isto É, 6 de março de 2013).
Para mudar esse quadro é preciso atacar suas causas históricas e culturais. As mulheres sempre foram vítimas de preconceito por parte da própria família, que as discriminava dos filhos varões, entendendo ser a mulher, educada apenas para ser esposa e mãe, devendo, portanto, obediência ao seu marido.
Em 17/09/1997, época em que muitas mulheres não teriam coragem, a dona de casa E. P. S., (cidade preservada) prestou queixa, na Delegacia Circunscricional, contra o motorista de táxi N. P. S., seu marido, com quem era casada há vários anos, dizendo que, enquanto dormia, fora agredida com socos na cabeça, só porque estava frequentando uma paróquia, além de já ter sofrido outras agressões de rotina, ou seja, espancamentos diários. Casos como esse e de agressões e espancamentos semelhantes têm registros diários nas delegacias brasileiras.
Para reverter essa situação, é necessário cuidar de uma nova educação, uma linha revisionista facilitadora no combate à violência contra a mulher, com maior rigor e agilidade processual, na aplicação da lei Maria da Penha, a fim de acabar com o machismo do valentão, guerrilheiro afetado que gosta de bater.
Hoje a violência atinge todas as classes sociais, das mais pobres como as donas de casas simples, às tituladas, médicas professoras, dentistas, empresárias, advogadas, atrizes, modelos, etc.
Dentre os fatores estudados, estatísticas comprovam que o desencadeamento da violência doméstica contra a mulher, dá-se pelo machismo, ciúme exacerbado, inferioridade funcional e econômica, desemprego, alcoolismo e pelas drogas (campeão da violência), aliados a outras relevantes: as mentes perigosas, originadas pelas psicopatias mentais.
Mudar esse quadro de violência contra a mulher não é fácil, é tarefa árdua, que temos enfrentado no combate diuturno nas delegacias, inobstante não é impossível. As mulheres que não buscarem ajuda e não vencerem o preconceito, o medo, a dor, a humilhação e a vergonha, denunciando seus parceiros, vão apanhar sempre. Convém ressaltar, que os relacionamentos conturbados a problemáticos, não se reverterão pela obediência e pelo medo.
É necessário denunciar toda e qualquer violência contra a mulher. O homem sabe que bater na mulher é crime, todavia, continuam batendo, entendendo ser a mulher sua propriedade, ademais, confiando também na impunidade.
Todos os dias, no Brasil, chegam às delegacias, mulheres agredidas, com cabeça enfaixada, perna engessada, braço quebrado, olho inchado, corpo furado por armas brancas, chicotadas, pauladas, facãozadas, lesionadas por armas de fogo, quando não são assassinadas. O inimigo íntimo é o namorado, o amante, o companheiro, ás vezes também, é o pai, o irmão, o cunhado.
O faroeste da violência contra a mulher cresce em todo país, tal a irracionalidade do homem, impunidade e a fragilidade da lei. O Brasil ocupa a 7ª posição no ranking de países com maiores índices de homicídios femininos no mundo.
É imprescindível mudanças profundas com responsabilidade do tratamento à dignidade e integridade da mulher.
A mulher não saiu do território bíblico só para ser a fêmea da espécie e apanhar. Deve, antes de tudo, ser respeitada e amada como pessoa humana. Denunciem! Não continuem dormindo com o inimigo.



Sione Porto é membro efetivo da ALITA




IV - HÉLIO PÓLVORA








EM LOUVOR DA MULHER GRAPIÚNA


Hélio Pólvora

    Incluo a mulher grapiúna nas homenagens ao Dia Internacional da Mulher transcorrido na sexta-feira passada, 8. Grapiúna é o gentílico de quem nasce na sul da Bahia, mais exatamente na região produtora de cacau. O pássaro que deu origem ao substantivo pode estar extinto, o chão do cacau talvez já não produza o mínimo necessário à moagem e se tenha de importar amêndoas da África ou Indonésia, mas o termo grapiúna pegou.
    Dois grapiúnas com assento na Academia Brasileira de Letras, Adonias Filho e Jorge Amado, utilizaram-no em seus discursos de posse e recepção transcritos em um livreto com o título de A Nação Grapiúna. A palavra nação tem aqui o mesmo significado emotivo de paese, que em italiano designa o povoado, a aldeia, como sinônimo de berço. Aliás, talvez sejam estas designações os verdadeiros países.
    A terra sul baiana cacaueira possui certas singularidades que a distinguem do sertão e do recôncavo. Tínhamos o que o velho e injustamente esquecido Adonias considerava “tipicidade evidente”. Hoje em dia o escaldado baiano é o mesmo, ou o pirão tem um tempero igual. Nós, grapiúnas, perdemos aquela capacidade de migrar subitamente da mais funda tristeza ao mais exultante júbilo, segundo as oscilações do preço do cacau. Aquelas oscilações nos faziam bem ao corpo e à alma. Éramos bipolares, vivíamos açoitados pela esperança. Hoje abrimos caminho no pólo sul, entre aglomerados de focas e pinguins.
    Mas a minha intenção era homenagear aqui a mulher grapiúna, e entrei em atalhos. Volto à estrada real. Dizem que por trás de homens empreendedores sempre há o vulto de uma mulher de muito trabalho, obstinação, fé e ânimo. Descontado o exagero dessas verdades, concluímos que as fazendas ou simples roças de cacau chegaram ao apogeu por obra da valentia submissa de muitas mulheres.
    Nelas ainda ecoam ruídos estranhos. Mesmo nas propriedades abandonadas, onde a queda de produção criou a figura do meeiro, ouve-se, principalmente nos finais de tarde e na boca da noite, o som rascante de enxadas arrastadas na terra, as pancadas ritmadas de facões e foices, o estrondo do machado, as cutiladas dos podões. Ouve-se pingar o suor do caboclo e do negro nos eitos, juntamente com os gemidos do vento. A essa sonoplastia fantasmagórica soma-se a trilha sonora dos afazeres domésticos: a retaguarda é garantida por mulheres que racham lenha, trazem água em latas na cabeça, colhem hortaliças,  capinam os arredores, acendem o fogão e assam carnes – e sobretudo parem filhos, remendam roupas, bordam, inventam remédios, mexem doces em tachos. 
    Tais mulheres viviam intensamente, alheias ao movimento da pêndula que, para elas, oscilava à toa. Se os homens criavam calos nas mãos, em pequenas propriedades, as mulheres os ajudavam a cavar a prosperidade com as unhas. Algumas ainda encontravam tempo para alfabetizar os filhos. Arrancavam pés de aipim, em noites trevosas, à luz do candeeiro, curavam tosses, encaixavam ossos quebrados, sabiam onde buscar ovos em ninhos distantes de galinhas – em tudo e por tudo as boas fadas do Leste e de todos os pontos cardiais.
    Desconfiem do silêncio de uma fazenda de cacau, mesmo deserta. Ela ressoa, geme, lamuria-se, grita e se esfalfa. É um acampamento de almas penadas, esvaídas no trabalho bruto do agora e agora e agora que inclui o amanhã e amanhã e amanhã shakespereano – mas sem as hesitações do príncipe Hamlet.
    Justamente por ouvir esse tropel de resistência e angústias foi que eu pretendi, quando tentava ações culturais em Ilhéus, criar um Monumento à Mulher Grapiúna, na Avenida Soares Lopes. Talvez não rendesse tantos dividendos turísticos quanto as Gabrielas que cheiram a quibe e exibem as coxas, encarapitadas em telhados baixos. Não deu certo, como também falhou a ideia de implantar na estrada para Olivença o Sítio da Batalha dos Nadadores, em memória dos índios aimorés arcabuzados no mar, onde se refugiaram em vão, pelos comandados de Mem de Sá, nos primórdios de Ilhéus capitania.


Hélio Pólvora, escritor, jornalista e ensaísta, tomará posse como membro efetivo da ALITA no próximo evento de 2013 


V - CERES MARYLISE







ASAS PARTIDAS
Ceres Marylise


Pobre mulher

de asas alquebradas!

No rosto desamparado,

o eterno canto calado.

A liberdade é pra ti,

o rumo do suicídio,

nos regimes seculares

de crueldade e machismo.

Aviltam teu corpo são,

anulam-te a alma sadia,

no sofrimento perpétuo

dessa vida em agonia.

Mulher de burca,

nunca pude ver teu riso,

és um pássaro enjaulado

pelo fundamentalismo:

resignado soluço

de uma terrível injustiça!




Ceres Marylise é membro efetivo da ALITA



VI - HÉLIO PÓLVORA





Muito obrigado, Yoani Sánchez!

Hélio Pólvora

Muchas gracias, Yoani Sánchez, por haver nos lembrado uma lição elementar de democracia. Logo você, dissidente cubana e, mais que isso, oprimida, vigiada de perto, amordaçada pelos irmãos Castro, teria de chamar a atenção de brasileiros alienados, meros recrutas de tropa de choque, para uma questão óbvia.
Isso mesmo, o direito básico de pensar, divergir, exprimir. Em Cuba não permitem pensamento e ação politica fora da orientação oficial. Prevalece a ideologia, o partido único, o líder imposto, que sabe ser carrasco para manter e sucateada estrutura de poder.
Recebida com xingamentos e protestos descabidos, no intento de lhe calar a voz, na chegada a Recife, Salvador, Feira de Santana e Brasília, você reagiu com serenidade e ironia. Atribuiu-os à liberdade de manifestação no Brasil e desejou que em Cuba fosse assim.
Reação irrespondível, senhora blogueira. Astuciosa, inteligente, sobretudo quando emitida com a coerência, a lógica que se espera de uma ativista política. Em dado momento, você lamentou que grupos fanáticos ainda considerem Cuba “a ilha da esperança”. Sim, até parece que o relógio da história parou depois de Sierra Maestra, que nenhuma ditadura se instalou em Cuba, que o Muro de Berlim continua de pé, com sentinelas e arame farpado, na cabeça de uma esquerda cediça.
Disseram que você, respeitada em vários países pelo blog Generación Y, está financiada pelos Estados Unidos. No entanto, na visita ao Congresso, onde sentiu o vento da pluralidade, apesar de ameaças à nossa plumitiva democracia de expressão, você condenou o embargo econômico, a base prisional em Guantánamo, o silêncio americano sobre cinco presos cubanos.
Mas a verdade dos opressores se aferra às suas conveniências de manter o poder de mando. Houve instantes em que você sentiu medo. Pouco faltou para agressões físicas. Felizmente a conspiração estancou na pobreza de espirito e intolerância dos terroristas tupiniquins. Boa viagem, Yoani, e dias melhores.