Por Cyro de Mattos
Nasci em Itabuna, sul da Bahia. Naquela cidade com cerca de trinta mil
habitantes, em uma região outrora rica com suas plantações de cacau, tive uma infância
diferente de hoje na qual os jogos eletrônicos transmitem o prazer decorrente
de automação da máquina no tempo computadorizado. No meu tempo de menino, os
momentos de prazer de cada aventura eram
vividos por mim mesmo com meus queridos
amigos. Éramos criadores, produtores e atores de nossas diversões no palco da
vida. Roubar fruta madura no quintal do
vizinho, jogar futebol em
campinhos improvisados nos terrenos baldios, brincar de mocinho e
bandido com balas de mamona na atiradeira, disputar quem tinha mais fôlego
quando mergulhávamos no rio de águas
claras rendiam sustos esplêndidos na
aventura de cada dia. Foi naquela cidade com estações temperadas de sol e chuva
que tive a primeira escola, a primeira
comunhão, a primeira namorada, o primeiro
carnaval, a primeira gravata, o primeiro banho de rio, o primeiro São João.
Joguei a primeira partida de futebol com os
meninos da rua onde morava.
Fiz o curso primário em minha cidade
natal. Minhas primeiras leituras foram em revistas de quadrinhos, os meninos de
meu tempo chamavam de gibi e guri. Nem sabia que com meus heróis inesquecíveis,
Mandrake, Homem-Morcego, Tarzan, Capitão Marvel, Super-Homem, Tocha Humana, O
Fantasma, Flash Gordon, Príncipe
Submarino, Durango Kid e outros – estava entrando na morada dos sonhos para
nunca mais sair. Os primeiros livros
que li foram da coleção O tesouro da juventude, de Júlio Verne; a
seguir alguns de Edgard Allan Poe, Charles Dickens e Monteiro Lobato.
O menino do interior foi para Salvador,
como o pai queria, para se tornar advogado. Na cidade de todos
os santos e orixás, concluí o curso ginasial
no Colégio Nossa Senhora da Vitória, dos Irmãos Maristas. Fiz o curso clássico no Colégio Estadual da
Bahia (Central). Tive nessa fase as descobertas de Machado de Assis, Camões,
Euclides da Cunha, Eça de Queiroz, Lima Barreto, Kafka, Hemingway, Sartre e de outros
autores importantes.
O meu primeiro conto, “A Corrida”, eu
publiquei quando cursava a Faculdade de Direito, em 1959. Saiu no suplemento
literário do Jornal da Bahia, dirigido por meu amigo, colega de faculdade e
companheiro de geração, João Ubaldo
Ribeiro, que depois viria ser um romancista de fôlego nas letras brasileiras. De leitor passava pela primeira vez para
autor de uma história. A sensação dessa
passagem foi de pura alegria. Não parei mais de andar nesse caminho de dar
palavra ao sonho.
Anos mais tarde, publiquei volumes de
contos e novelas, até que migrei da
prosa para a poesia. De repente, de uns anos para cá surgiu de dentro de mim
aquele menino franzino e esperto, pedindo que escrevesse também para crianças.
Tenho grande prazer quando escrevo para o leitor infantil e juvenil. Quero que
esse menino escritor para outros meninos leitores nunca mais se afaste de meu
pequeno coração, que um dia foi trancado
na alma com pedaços de infância pelo mundo dos homens. E assim as coisas
passaram a ter o gosto de uma fruta que acaba. Fiz até um poema em que falo
disso, e que está em um dos meus livros inéditos, “A Poesia É Um Mar - Venha Comigo Navegar”.
Mostro agora esse poema para vocês. A Estrelinha - Achei
uma estrelinha/ Que caiu no mar/ E veio dar na praia./ Perguntei pra ela:/ - O
que vale mais,/Brilhar no céu/ Ou no vaivém das ondas?/ Ela então respondeu:/ -
O mundo me encanta/ Quando brilho lá dentro/ E nunca se apaga/ Seu coração de
criança.