A CILADA CONTRA IKU - Ruy Póvoas




 

A CILADA CONTRA IKU


            Contam os mais velhos que havia uma cidade que estava sendo castigada por epidemia. Era uma festa para Iku, que andava atarefado em levar tanta gente para fora deste mundo. Mas havia um homem que resolveu fazer diferente. Ele foi em busca de um conselho de Orumilá. Então, ele procurou um babalaô para fazer uma consulta, saber o que o Pai Maior tinha para lhe dizer. Não deu outra: o babalaô jogou o opelé e Orumilá respondeu direitinho ao que o homem queria saber.
            Foi recomendado que o homem fizesse um ebó com certos objetos de segredo e seguisse todo o preceito. Também conseguisse um quati vivo e amarrasse o bicho acima da porta de sua casa. O homem voltou de lá muito confiante e foi providenciar os objetos necessários. Encomendou um quati vivo a um caçador e amarrou o bicho pendurado acima da porta, para que todo mundo visse aquilo.
            Vai daí que Iku entendeu de fazer uma visitinha à família do homem. Foi chegando, todo enrolado em seu manto preto, porrete na mão, segura de si, confiante no seu poder. De repente, ele suspendeu a cabeça e viu o bicho pendurado acima da porta. Disse para si mesmo:
            – Coisa boa! Vou ter até uma sobremesa...
            Foi se aproximando, se aproximando... E o quati bem quieto, pendurado. E quando Iku estirou o braço para pegar o quati, o bicho deu um bote na cara de Iku. Todo mundo sabe que as garras de um quati cortam igual a navalha. Quando um caçador vai para o mato e que seus cachorros avistam um bicho desse, a primeira coisa que ele faz é chamar os cachorros de volta. Do contrário, o quati deixa os cachorros em pedaços. Pois bem: as garras do quati lanharam a cara de Iku. Com o porrete que levava, Iku tentou acertar o quati, mas errou o golpe e acertou na corda. O bicho se soltou e pulou na cabeça de Iku, que saiu em desabalada carreira pelo mundo a fora, prometendo tão cedo não voltar ali.
            Pois é: para espantar a morte basta reinventar a vida.

Ruy Póvoas
Itabuna, 24/02/2010