FLORES, ZECA PAGODINHO E CIA. - Sônia Maron








*Sônia Carvalho de Almeida Maron 
                                                                   
Para Roque, do “Mundo das Flores”, Ademar estofador e outros e outros   



       No Centro Comercial de Itabuna existe uma floricultura identificada pelo nome romântico de “Mundo das Flores”. Nome romântico e verdadeiro pela singular mercadoria oferecida, linda e variada, e cavalheirismo de Roque,  proprietário, que me  oferece sempre uma rosa – e ele sabe a minha preferida, rosa chá ou amarela – quando apareço em sua barraca para comprar flores destinadas a enfeitar minha casa, presentear alguém em datas festivas ou como última homenagem aos amigos queridos que viajam sem dizer adeus. O último mal educado foi Nilton Galvão. Há poucos dias Roque escolheu uma rosa para mim e outra para minha amiga Aninha Aquino, que me acompanhava. Conheço Roque da floricultura do Centro Comercial há muitos e muitos anos e ele me conhece.  Desse homem humilde, que sofre para exercer sua atividade comercial em um local onde falta tudo, da higiene à compaixão, sempre recebi flores. Até mesmo um delicado e valioso bonsai em meu aniversário. Por que? Por nada, absolutamente nada. Sou uma cliente como tantas outras e cliente modesta, sem dinheiro para extravagâncias, graças a Deus. Eu identifico Roque da Floricultura onde quer que o encontre, como identifico Ademar, meu querido Ademar, estofador; Nilson e Lapinha, pintores da minha confiança;  Wagner, taxista que eventualmente procuro; Hamilton, Antenor e Rivaldo, zeladores do edifício Thereza onde residi vinte e cinco anos. Eu os conheço, estimo, identifico, conheço seus traços fisionômicos e até mesmo a  voz de cada um deles. Fazendo referência às pessoas que não estão no topo da pirâmide social, como os feirantes, estofadores, pintores e zeladores de edifícios, não significa conhecer e identificar apenas aqueles que estão na base, especialidade dos aspirantes a cargos políticos, o que não é o meu caso. Conheço e identifico também celebridades como Carlos Mário da Silva  Veloso, ex-presidente do STF; Paulo Roberto Bastos Furtado, ex-presidente do TJ-BA e ex-ministro substituto do STJ; Fernando Rios, intelectual brilhante, nosso conterrâneo; Osmundo Teixeira, escultor, o mais famoso santeiro do Brasil; Paulo Lima e Vercil Rodrigues, membros da co-irmã AGRAL e outros personagens igualmente conhecidos e estimados. O pecado que nunca cometi, graças a Deus, foi exibir a identidade funcional e dizer: “Sabe com quem está falando?”, sem dizer  o que sou e porque ocupo aquele espaço debaixo deste céu estrelado à noite e azul durante o dia.
          Por falar em identificação e reconhecimento, os aposentados, como eu, comparecem anualmente para o recadastramento em repartições previamente indicadas pelo órgão público onde estão cadastrados como inativos. Este ano, no SAC, apresentei a identidade funcional  por conter todos os dados e foi recusada: o funcionário preferiu a carteira de habilitação.  E daí? Nenhuma ofensa em ser identificada como motorista. Em minha idade, dou graças a  Deus porque ainda conduzo com relativa desenvoltura o meu carrinho. Afinal, o que sou mesmo é um ser humano que respeita seu semelhante, que tem nome de batismo e registro civil, pertencendo ao grupo social ou entidade que representa, sem pressupor que é por todos conhecida. Longe do quotidiano de minha cidade durante quinze anos por força da promoção para a capital, voltava nos fins de semana e o itinerário era sempre o mesmo: da estação rodoviária para a minha sala de aula na UESC. Devo ter perdido a oportunidade de conhecer muita gente importante e famosa. Paciência... Aprendi a repetir, com Zeca Pagodinho:
                      Sou feliz e agradeço
                      Por tudo que Deus me deu.
          Em verdade o que me levou a escrever foi a gentileza de Roque, do Mundo das Flores. O que  conta mesmo, minha gente, é a sinceridade, a pureza, a sensibilidade, a resignação e a coragem dos pequenos comerciantes daquele local, “que já passaram por tudo nessa vida e em matéria de guarida esperam ainda sua vez”. Serão sempre reconhecidos, mesmo não sendo celebridades.



                                *Sônia Maron é membro da Academia de Letras de Itabuna - ALITA