CARTA A DELILE - Sônia Maron




Itabuna, 20 de maio de 2013



Delile, minha querida

Recebi seu  presente como o melhor de todos naquele dia, dedicado às mães,  data comemorativa instituída por alguém que imagina a figura da  MÃE como uma máquina de perdoar: bastaria um dia a ela dedicado, flores e mais flores, presentes materiais e “abracadabra”: todas as mágoas estariam esquecidas, todos os pecadilhos que envolvem desamor, desatenção, insensibilidade etc. etc. estariam deletados. Simples assim. Enfim, como as mães são os seres mais amnésicos do mundo, a vida continua e viva a vida!
Volto a afirmar que os seus livros foram mesmo o melhor dos presentes. Notadamente o prefaciado por nosso tão amado RUY, saiba que as lembranças que você tece com tanta sensibilidade, são, em grande parte, também minhas. Quer um exemplo? Você é sobrinha de Dr. Cordeiro e eu sou sobrinha neta de Martinho Conceição; tia Alayde, mulher do “coronel” Martinho Conceição, era irmão da minha avó paterna. Vai daí que nossas lembranças por vezes são comuns, como a nítida recordação que aflora neste momento, de uma festa na casa do seu tio, à qual compareci com cerca de cinco anos de idade, levada por minha prima Dulce Almeida Conceição Rebouças, casada com Diógenes Rebouças,  professor na UFBA e engenheiro responsável pelo projeto da nossa catedral. O que não recordo com precisão é se a festa foi para receber Juracy Magalhães ou o Brigadeiro Eduardo Gomes. Mas eu participei, isso é verdade. E nossos tios eram correligionários, líderes políticos da União Democrática Nacional, o partido da “eterna vigilância”. Cheguei a usar, ainda criança, e porque achava bonito, um escudo da UDN, espécie de “boton” de fundo azul, contendo o desenho de uma tocha em vermelho com frase sacramental em caracteres escuros, encimando-a. Hoje, o fogo da “eterna vigilância” apagou e ninguém vigia nada e nem acredita na eternidade. Aliás, na pós-modernidade que vivemos os valores daquele tempo são hilários. Resta-nos, se ainda deixarem, tecer lembranças. A propósito do nosso encontro de lembranças, Mariinha ( Maria da Conceição Almeida Santos) filha do Coronel Godofredo Almeida e casada com Aderson Rayol dos Santos, primeira mulher a dirigir um automóvel em Itabuna, é a mais amada das minhas primas, a mulher que mais admirei  quando adolescente até a idade adulta. Diria mesmo que continuo devotando a ela o mesmo sentimento de carinho e gratidão,  na dimensão em que se encontra, onde deve continuar sua trajetória de bondade, elegância, sensibilidade e respeito ao próximo. Acredito que as pessoas continuam como a frase do Pai Nosso: “assim na terra como no céu”, colhendo o que semearam. Antes que indague a origem do parentesco, direi que “tio” Godofredo era primo da minha avó Erotildes, irmã de Alayde Conceição. Entre nossos ausentes queridos destaco Dr. Mirandinha, o meu pediatra, casado com sua prima, Lygia Miranda.
Recebi há alguns dias uma carta de Rosalina Molfi de Lima, minha amiga querida, colega do curso de magistério do Colégio Divina Providência, em 1956, amizade que cultivo com o maior carinho. Em anexo, algumas crônicas e um cordel inspirado na história da FESPI/UESC. Copiei para você, sei que vai gostar. De quebra, o meu discurso de posse em nossa ainda iniciante Academia de Letras de Itabuna.
As lembranças são muitas e o tempo é curto. Sou, modestamente, também tecelã de lembranças e espero um dia registrá-las, imortalizando-as, como você fez com tanta maestria. Conversaremos em outra oportunidade sobre  nossa experiência comum de uma Itabuna com direito a um passado que guiou sua trajetória. Como o nosso passado vem sendo demolido criminosamente, o nosso futuro é sombrio. Resta apenas rezar, eu acho. Dizendo melhor, só Jesus na causa e São José como assessor.


                                   Um beijo carinhoso
      
                                               *Sônia




*Sônia Maron é presidente da ALITA