DISCURSO DE POSSE DA MESA DIRETORA DA ACADEMIA DE LETRAS DE ITABUNA - BIÊNIO 2013/2014





DISCURSO DE POSSE DA MESA DIRETORA DA ACADEMIA DE   LETRAS DE ITABUNA  - BIÊNIO 2013/2014                                            

Sônia Maron

Ilustres componentes da mesa que honram nossa reunião   solene de posse, permitam-me escolher para representá-los na saudação de praxe, os nomes de Andirley Nascimento e Altamiro Conceição Oliveira, respectivamente presidente da subseção da OAB e Capitão da Polícia Militar diretor adjunto do Colégio Militar de Itabuna, não pelos títulos que hoje ostentam, mas pelo fato de representarem meus ex-alunos, aos quais considero uma “categoria especial de filhos”; meus filhos, genro, nora e netos, senhores convidados, meus caros confrades e confreiras

  Minhas primeiras palavras, neste momento, não foram inspiradas na obra de nenhum escritor consagrado, nem de alguém agraciado com títulos de mestre, doutor ou PhD. São palavras simples, revestidas de sabedoria, a sabedoria daqueles que vivem peregrinando em nome da paz e da fraternidade. Iniciando um novo biênio, preferi a inspiração de um texto que nos leva a refletir que a sabedoria prescinde de fardões, colares, capas, currículos recheados de livros, mestrados, doutorados e outras láureas.É simplesmente a essência de tudo de bom e positivo captado do viver que viabiliza nossa convivência com o próximo, melhor dizendo,  com todos os companheiros de jornada. E nossa bagagem para percorrer o caminho é permanecer alerta em todo o percurso, afastando os obstáculos para facilitar o acesso daqueles que caminham ao nosso lado ou atrás de nós, seguindo nossos passos e aprendendo com o nosso exemplo. As palavras que anunciei como reflexo da sabedoria, foram escritas pelo DALAI – LAMA quando se refere à plenitude da vida  e à conquista da felicidade. Diz o líder dos budistas que não há nada de misterioso nesse projeto, que “Consiste apenas em levar os outros em consideração. E se você fizer com sinceridade e persistência, pouco a pouco, passo a passo, será capaz de reordenar seus hábitos e atitudes e pensar menos em seu pequeno mundo e mais nos interesses de todas as outras pessoas. E encontrará a paz e a felicidade para si mesmo”. Em outras palavras, é dando que se recebe, fórmula mágica para a convivência entre seres humanos, gregários por natureza, tão frágeis que não conseguem viver sozinhos e precisam da harmonia e da união para cumprir sua trajetória na vida social.
     As instituições como nossa academia nascem e são constituídas voltadas para o bem comum, visando objetivos nobres e    revelados através de projetos que transcendem a vaidade pessoal. A convivência pacífica entre os membros e o êxito do ideal que reuniu um grupo de amigos, como é o nosso caso, estão estreitamente ligados à humildade e ao verdadeiro sentimento de fraternidade. A propósito, o site da Academia Brasileira de Letras oferece um texto de Arnaldo Niskier nos seguintes termos: “Academia é convívio, estão condenados a conviver para o resto da vida” e prossegue o confrade da academia-mãe, dizendo que importa em renúncia a personalismos ou ao exercício de atitudes de arrogância  ou prepotência”. Acrescentaria à oportuna reflexão do famoso acadêmico que a vida em grupo implica, também, em doação e tolerância. Parafraseando Fernando Pessoa, em seu verso tão conhecido, lembraria que “tudo vale a pena se a alma não é pequena”. Felizmente o pequeno grupo  que vem lutando pela sobrevivência da ALITA não é composto de pessoas de alma pequena. O nosso sonho é reinventar a noção de academia de letras, levando sua mensagem ao jovem, fazendo germinar a semente que servirá para revitalizar a cultura de uma cidade tão sofrida, condenada a não preservar sua memória, o que  leva a não cultuar o respeito ao seu passado e às suas tradições. É defeso aos filhos de Itabuna -  como o são, quase todos, nesta instituição - cultuar a imagem de uma casa como esta funcionando como uma “torre de marfim”, onde pessoas de meia idade ou idosas disputam entre si quem escreveu o maior número de livros, quem é detentor do número maior de prêmios, quem figura como campeão de obras publicadas em outros idiomas, láureas que não são transmitidas a quem precisa de conhecimento, nem podem servir de epitáfio se considerarmos o espaço reduzido das lápides modernas. Tentamos cumprir a trajetória que traçamos e deixaremos como legado aos jovens, emissários do amanhã, que será melhor e mais justo: o amor à cultura no seu sentido mais amplo e a busca permanente do saber, convencendo-os de que o conhecimento é um desafio permanente e enriquecedor.
      A sucessão de dirigentes é exigência do sistema democrático e como nossos objetivos são comuns, não existe hierarquia ou disputas por cargos ou encargos, como é comum na vida pública, até porque nossa mesa diretora tem apenas um biênio de duração, melhor dizendo, nossos cargos não são e não podem ser vitalícios e é bom que seja assim, em sadia alternância.    Somos uma modesta sociedade de direito privado, sem fim lucrativo, onde presidentes,  vice-presidentes e diretores de diferentes setores administrativos vivem em parceria e harmoniosa convivência, sem a preocupação do “tome lá e dê de volta”. Graças a Deus não temos nada para dar, a não ser nosso exemplo de que é possível executar um trabalho  comum para servir à comunidade que nos acolhe; cada um de nós, lúcidos que somos, reconhece, dentro de sua aptidão intelectual e profissional, o melhor meio de prestar a colaboração adequada ao crescimento do sonho já transformado em realidade.
     O sonho de uma academia de letras em Itabuna, para o nosso grupo, tomou forma quando foi escolhida a primeira mesa diretora, em março de 2011. O primeiro presidente, Marcos Bandeira, teve o nome indicado por um dos confrades, Cyro de Mattos, sob a alegação de que seria o melhor pela capacidade de “blindar” a academia, declinando a escolha unânime do seu  próprio nome. Não se referia, com absoluta certeza, ao cargo de Marcos, um juiz de direito. Estava implícito, em sua observação, que um cargo decorrente da aprovação em um concurso público de provas e títulos não acrescentaria muito ao caráter reto e límpido de Marcos  Bandeira.  Significava que a aprovação ao nome de Marcos protegeria a academia pelas virtudes que ornam seu caráter de cidadão de conduta ilibada e elevado saber jurídico, como determina a Constituição para compor a Suprema Corte. Acrescente-se, ainda, que  nosso presidente emérito consegue aliar ao conhecimento jurídico a cultura humanista, a sensibilidade e comprometimento com o drama social, no tocante à sua maior chaga: a  criança vulnerável e abandonada pelo poder público que dissimula a realidade de um país sem educação, sem saúde e sem segurança,  caminhando a passos largos para a perda dos seus valores morais e éticos. Nesse caos em que vivemos, nosso presidente emérito conduz uma Vara da Infância e Juventude colaborando efetivamente para a recuperação de jovens portadores de desvios de conduta, enfrentando dificuldades materiais incalculáveis, sem perder a esperança, sempre vislumbrando uma luz no fundo do túnel da indiferença e da irresponsabilidade. O nome de Marcos Bandeira foi  e sempre será o indicado para conduzir qualquer instituição que necessite, para  sobreviver, de alguém que não perdeu a capacidade de sonhar e de indignar-se. E nós temos a sorte de contar com seu entusiasmo e colaboração, sem falar na postura de serenidade e equilíbrio que nos conduziu a salvo até este momento. Para enfrentar o pesado e quase impossível encargo de substituí-lo, posso apenas pedir que “rezem por mim”, repetindo a inspirada lição do Papa Francisco.
     Associei, muitas vezes, a idéia de sonho à existência da nossa academia de letras. Não posso encerrar minha manifestação sem registrar quando e onde nasceu nosso sonho. Teve início no século passado, quando um grupo de bacharéis em direito, unidos por estreitos laços de amizade e de amor por esta região, resolveram  criar a Faculdade de Direito de Ilhéus e na década de sessenta foi proferida a aula inaugural em 2 de março de 1961: Soane Nazaré de Andrade, Amilton Ignácio de Castro, Francolino Gonçalves de Queiroz Netto, José Cândido de Carvalho Filho, Jorge Fialho, Wilson Rosa da Silva, Acioly da Cruz Moreira, Manoel Targino de Araújo, Altamirando de Cerqueira Marques e outros. Itabuna, por sua vez, criou também suas faculdades de Filosofia, Economia e Administração, onde tinham destaque nomes como Litza Mary Modesto Câmera, Delile Oliveira, Valdelice Pinheiro, Érito Machado e tantos outros sonhadores. Em 1974, consumou-se a fusão dessas casas de ensino superior em uma Federação das Escolas Superiores de Ilhéus e Itabuna, de caráter particular. Vencidas muitas crises, a única solução, à época, encontrada para não morrer o sonho do ensino superior em nossa região, foi a estadualização: surgiu a  UESC, Universidade  Estadual de Santa Cruz, designação há muito tempo escolhida por um dos fundadores, segundo Valdelice Soares Pinheiro, “o homem que sabia sonhar,” que ela imortalizou em um poema dedicado a Soane Nazaré de Andrade. Se os informes históricos não estão corretos, submeto-os à crítica da Profª Drª Janete Macedo e afirmo que são irrelevantes para o fim colimado, visto que são apenas detalhes necessários para proclamar que a ALITA é, basicamente, a FESPI e a UESC. É a prova incontestável que a educação no sentido mais amplo, responsável e competente é o único caminho para a redenção de um país.
    Partilho o privilégio de ser ex-aluna da FESPI e ex-docente da UESC, com  a maioria dos membros desta academia de letras. Como ex-magistrada criminal, não dispenso a prova material  e cito os nomes: Ruy Póvoas, Marcos Bandeira, Maria de Lourdes Simões (Tica), Lurdes Bertol  Rocha, Ceres Marylise Rebouças, Margarida Fahel, Carlos Valder, Dinalva Melo, Raimunda Assis, Janete Macedo, Jorge Batista, Silmara Oliveira, Carlos Eduardo Passos, Ary Quadros, Gustavo Veloso, Maria Luiza Nora, Luiz Bezerra, Maria Palma Andrade, Marialda Jovita, Rilvan Santana. Se ocorreu alguma omissão será sempre no sentido de que seja acrescentado mais um com a mesma origem. Esta academia, meus amigos, tem a doce melodia dos poemas de Valdelice Soares Pinheiro, e como exemplo ficam os versos do poema “Para um homem que sabe sonhar” dedicado a Soane Nazaré de Andrade, que também figura entre nossos confrades:
  
“Cada espaço deste chão
cada folha, cada flor, cada árvore,
cada ave que pousa ou passa por aqui
na expressão do vôo,
o sonho livre da asa;
cada pedra,
cada grão de cimento,
cada prédio,
 cada sala, cada voz nessas salas,
como que dizendo,
na extensão do tempo,
o sonho de sempre
que o tempo não leva;
                                                      cada coisa, enfim,
e cada destino
e cada passo
e cada gesto
guardam a presença
de seu sonho confirmado
na expansão infinita da semente
para a verdade do fruto
que já se colhe aqui”

Valdelice – 31.07.1985

Respondeu Soane, em 1994, na cerimônia de aniversário da Universidade: “O passado se insere no presente. Até nossos mortos convivem conosco e não raro apontam-nos o caminho. Quem ousaria dizer que Valdelice está morta? Valdelice está aqui. Sinto-a por inteiro no espírito e na força da Universidade, não só no Centro de  Estudos Filosóficos Valdelice Soares Pinheiro, mas em cada pessoa, em cada espaço, em cada matéria deste Campus – todo ele espírito de Valdelice. Temos todos, queiramos ou não, um compromisso com a História. Um compromisso com a eternidade. Porque a Universidade de Santa Cruz viverá por todos os tempos, enquanto vida houver neste chão abençoado do universo que é nosso planeta Terra.”
Agradecemos, mais uma vez, à FTC, nossa parceira do primeiro momento, representada pelos educadores Profs. Cristiano Lobo e Raildes Pereira, que repetem o verso de Castro Alves “bendito o que semeia livros, livros, à mão cheia e faz o povo pensar...”; aos confrades Ceres Marylise Rebouças e Jorge Batista, respectivamente vice-presidente e diretor de ações culturais neste novo biênio, responsáveis pela beleza e requinte desta festa; à Filarmônica Euterpe Itabunense, nossa nova parceira; à Profª Maria Luzia de Mello, geógrafa com mestrado em Meio Ambiente, também nossa parceira, coordenadora de uma instituição que idealizou denominada  Centro das Águas – Espaço Cidadão, dedicada a estudos pela revitalização do Rio Cachoeira, instituição  que aguarda da sociedade organizada o apoio necessário à defesa de iniciativas desse porte; agradeço, particularmente, a LINDAURA BRANDÃO DE OLIVEIRA, responsável por minha formação da alfabetização ao curso médio de magistério, educadora incomparável de inúmeras gerações desta pobre cidade amnésica e que deixou a prova material de sua passagem por esta dimensão em um prédio modesto, na rua São Vicente de Paula, recentemente destruído por ser considerado descartável graças à ação daqueles que não alcançam o significado do patrimônio imaterial, que não é mensurável, nem passível de estimação econômica e que consegue o milagre de transformar um país em nação; e também agradeço, pessoal e carinhosamente, a Maria Célia Midlej, parceira e amiga querida de todos os momentos, em quase seis décadas de cumplicidade e a Ana Maria Aquino, com o mesmo tempo de serviço em minha vida e em meu coração, amiga de todos o momentos como Maria Célia, ambas emprestando o toque especial de suas mãos,  a sensibilidade, inteligência e solidariedade que definem o perfil de verdadeiras cidadãs e damas da sociedade itabunense.
Com a devida vênia dos confrades e confreiras de universidades consagradas, respeitados e famosos, que honram esta academia com seus nomes e suas obras, nós, da FESPI e da UESC somos o corpo e alma da ALITA e os convidamos a  seguir viagem. Nossos mestres deram a partida. Com a paz no coração, vamos embora!