A VOZ DAS RUAS - Sione Porto


A VOZ DAS RUAS



Sione Porto*

                          

       Sob os aplausos do mundo, desde 1968 não se ouvia a voz das ruas quando ecoou em alguns países como Espanha, Polônia, Tchecoslováquia e Brasil, nos principais protestos  contra os governos repressivos, com grandes manifestações em todo o planeta. A recente manifestação com protestos históricos, iniciada pelo Movimento Passe Livre, soou com uma renovação em São Paulo e se propagou pela maioria dos estados brasileiros. A luta da esperança com passeatas pacíficas - a mais esplendorosa de 100 mil pessoas no centro do Rio de Janeiro - foi o levante de todos os brasileiros conscientes, pobres, ricos, gente trabalhadora, e não apenas da elite mais intelectualizada.

     O movimento revolucionário surpreendeu a todos com as chamadas através das redes sociais e o boca a boca nas ruas, que arregimentaram vários segmentos da sociedade por todos os estados. Engajaram-se apartidários, como que reflorescendo o Iluminismo e a ideia de um mundo novo, do verdadeiro renascer da democracia no velho Brasil que estava adormecido em berço esplêndido: e eis que surge a primavera verde amarela! Agora é a hora!

        O descompasso do governo indesejado, a irrupção de crise econômica, o desencadeamento pelo maior escândalo da República – mensalão do governo Lula, que culminou na condenação dos políticos que dele se locupletaram - além de outros políticos também corruptos, aliados à crescente corrupção somada às fichas sujas, levou ao fuzilamento das instituições com consequências catastróficas. Para vitória da democracia, a Voz das Ruas, impõe-se e assusta.

       Não há mais espaço para os desmandos deste e de outros governos, para o enriquecimento ilícito, para o excesso de desvio de verbas públicas (transporte, saúde, educação, segurança, etc.), fraudes, sonegação de impostos, propinas nas cuecas, passeios nos aviões da Força Área Brasileira. É tempo de reconectar as instituições, reconhecer as pretensões dos brasileiros em decidirem sobre os seus direitos.

       Na contramão, a classe política, pelos seus desacertos e confiança na impunidade, com a crise escandalosa gerada pelo superfaturamento dos estádios para a Copa das Confederações (2013) e Copa do Mundo (2014), perdeu-se e elevou a força dos protestos. O movimento se fortaleceu. O povo cansou de fechar os olhos para as irregularidades em que a saúde padece, a insegurança extrapola os seus limites em graus de tolerância e a educação precária sempre foi escondida através de projetos maquiados em todos os sentidos, além dos péssimos salários pagos aos professores.

       Hoje, o povo representado pela sociedade democrática, acredita em um futuro mais brilhante pelas transformações e mudanças ideológicas que virão através das descobertas de seus direitos em exigir avanços civilizantes na área social. O espetáculo das ruas cheias de crianças, adolescentes, adultos e idosos, levantou a bandeira do combate à corrupção avassaladora que tomou conta do País. O que se viu foi algo inédito, que nem mesmo o fanatismo pelo futebol conseguiu encobrir o brilho da demonstração cívica de maturidade de um povo que não se curva mais à violenta repressão registrada contra manifestantes pacíficos, classificados de arruaceiros (extraímos os atos de vandalismos que foram orquestrados para deturpar o movimento).

    O povo está vivo, mostrou que o ano de 1992, quando aconteceu o impeachment de Collor, jamais será esquecido, assim como a pandemia da corrupção pública que afeta a preservação do princípio da dignidade humana e os fundamentos do Estado democrático de princípios léxicos múltiplos. Isso não será mais tolerado na conduta abusiva do exercício do mandato, cargo ou função pública para que a memória do povo não seja, outra vez, amnesiada.

       As censuras não tratam tão somente do partido dos trabalhadores; é fato que outros partidos se enquadram na corrupção. Um basta deve ser dado na cultura da impunidade vigente, a exemplo dos escândalos de Jorgina de Freitas (1992); Impeachment de Fernando Collor (1992); Escândalo SIVAM (1995); Dossiê Cayman (1998); CPI Banestado (2003); Operação Anaconda (2000); Escândalo dos Bingos - Valdomiro Diniz (2004); Escândalo dos Fundos de Pensão (2002); Caso Renangate (2007); Escândalo do grampo do BNDES (1998); Escândalo dos Correios (2005); Caso Toninho do PT (2001); Luiz Estevão (2000); Caso Bancoop (2010); Privataria Tucana (2011); Escândalo dos Cartões Corporativos (2008); Banco Santos (2006); Caso Celso Daniel (2002); CPI das ONGs (2007); Mensalinho (2003) e Mensalão (2005-2006); Erenice Guerra (2010); Operação Tsunami (2006); Caso Rosemary Noronha-Lula (2012), e tantos outros...



“Se você é neutro em situações de injustiça,
você escolheu o lado
do opressor.”

Desmond Tutu









*SIONE MARIA PORTO DE OLIVEIRA é pós-graduada em Direito Administrativo e membro da Academia de Letras de Itabuna