MINHA POBRE BUERAREMA
*Sônia Carvalho de Almeida Maron
Gente
de Deus! Eu não posso silenciar! Ultimamente ando como “siri na lata”, fazendo
barulho contra o descaso pela preservação da memória de Itabuna, proclamando
seus mitos e procurando defender sua história. E onde fica, nessa cruzada
talvez inútil, a nossa Buerarema? Com todo respeito aos tupinambás e com a
augusta permissão dos mesmos, quero afirmar que Buerarema, coitadinha, também
tem uma história que precisa ser divulgada, agora, com urgência, antes que a
morte sepulte seus sonhos como aconteceu com Sodoma, Gomorra, Pompéia e outras
cidades menos votadas. Sodoma e Gomorra foram destruídas pela prática do
pecado; Pompéia pela erupção do vulcão Vesúvio. E Buerarema? Qual o crime ou o
pecado dos pequenos produtores? Será que o plantio de mandioca, chuchu, jiló,
maxixe, quiabo, em pequenos sítios e quintais, para prover o sustento, passou à
categoria de crime hediondo?
Eu não posso silenciar por três motivos:
1º - omissão é crime; 2º - eu instalei a comarca de Buerarema; 3º - realizei o
plebiscito que definiu a emancipação de São José da Vitória e dei posse ao seu
primeiro prefeito. É claro que todo
mundo esqueceu, pois em nossa região basta uma boa noite de sono para apagar
toda a memória da vida social e/ou política de um município.
Surpresos? Pois é. É aquela velha
história da verdade, que não tem costura. Se provas materiais forem exigidas,
se ainda não destruíram os livros de atas das duas cidades, terão a
confirmação. Basta procurar. Se não quiserem ter o trabalho entediante da
pesquisa, tenho certeza que a Profª Draª Janete Macedo, historiadora que se
transformou em guardiã da memória desta região, como cidadã comprometida e
responsável, não negará a colaboração dos estagiários de História da UESC sob o
seu criterioso comando.
Podem até dizer que não é da minha
conta, pois juiz aposentado não tem voz. Puro engano. Juiz em exercício é
engessado pelo compromisso de isenção e imparcialidade, sem falar no dever
funcional de não responder aos ataques e críticas injustas. O aposentado é
livre, leve e solto, contando apenas com a proteção Divina. Se pensam que a
consciência do magistrado aposentado está adormecida, saibam que deu lugar, em
dimensão maior, à consciência do
cidadão, vivo, lúcido e participativo, com descendentes que vão continuar
vivendo nesta região.
Fui designada, nos idos de 1988,
pelo Desembargador Gerson Pereira dos Santos, à época presidente do TJ-BA, para
conduzir a etapa última e definitiva de instalação da Comarca de Buerarema.
Obedeci com o entusiasmo reservado aos filhos legítimos desta região. Orientei
a organização do setor administrativo, em caráter de urgência, designando serventuários
de Itabuna para dirigir os novos cartórios – conforme a legislação pertinente -
e contei com a boa vontade e generosidade do prefeito da cidade para reforma do
local onde funcionaria o novo Forum. A
cerimônia formal de instalação da Comarca de Buerarema foi presidida pelo
presidente da AMAB, desembargador Mário Augusto Albiani Alves, representando o
presidente Gerson Pereira dos Santos, que se encontrava convalescendo de uma
cirurgia. Permaneci como juíza pro
tempore da Comarca de Buerarema durante cerca de um ano, até a nomeação do
titular, Juiz Ruy Brito, atualmente na Comarca de Salvador.
Em sequência, veio o plebiscito pela
emancipação de São José da Vitória, sob minha responsabilidade, conforme
designação do presidente do Tribunal Regional Eleitoral –TRE, Des. Luiz
Pedreira Fernandes. Reconhecido e consagrado o resultado do plebiscito,
legitimei a posse do primeiro prefeito do novo município baiano.
O que terá acontecido? Como pode o
juiz que viu nascer uma comarca e um município entender? Será que a destruição
de Buerarema é uma maneira de beneficiá-la, buscando um pacto de medidas
socializantes? Ou as lutas que levam à radicalização, destruindo famílias e
bens privados, são o meio utilizado para a conquista da justiça social
absoluta? Como pode desenvolver-se uma luta fratricida entre dois segmentos
sociais carentes, um superprotegido e outro desprotegido? E os homicídios? Não
figuram mais no art. 121 do C.P? Onde foi parar o princípio fundamental do
respeito à dignidade humana e o dever de considerar a casa asilo inviolável? A
Constituição ainda existe?
O pesadelo vivido por Buerarema faz
lembrar a “caixa de Pandora”: aberta, libertou todos os males do mundo, que até
hoje afligem a humanidade. Ao tentar fechar a caixa, para evitar uma desgraça
maior, Pandora só conseguiu prender a
esperança. É possível salvar a esperança. Como sempre, a escolha é nossa.
*Presidente da Academia de Letras de
Itabuna
Juíza de Direito aposentada do TJ-BA
Sônia Carvalho de Almeida Maron |