Por Consuelo Pondé de
Sena
Desde que passei a conviver com essa “pulmonite”, comecei a experimentar
novas e desagradáveis emoções, antes jamais por mim sentidas. Doença terrível
que me tolhe o tônus vital, deixando-me diferente do que sou, ou fui.
Não tenho certeza de que voltarei a ser a mesma, porque senti na pele a
fragilidade da nossa condição humana e me sinto outra pessoa.
São esquisitos estados d’alma, que me deixam aturdida, porquanto não os
identificava como próprios do meu espírito. São situações muito
novas, jamais pressentidas. Mesmo porque, não é fácil se imaginar o
desconhecido.
Que está havendo? O que está se passando? Confesso que não sei responder
o que, de novo, se introduziu na minha vida, deixando-me com uma sensação de
que sou outra criatura.
Mudei o couro? Penso que, de certa forma, sim. O camaleão não passa por
esse processo? Transfigura-se para ser confundido? Sei lá! Dentre milhares de
pensamentos desordenados, que povoam meu cérebro está a referida festa, que me
deu tanta alegria. Vesti um lindo traje vermelho, que foi muito apreciado por
homens e mulheres. É que a cor me fica bem e todos gostam quando a uso.
Este ano, a festa vai acontecer na quarta-feira. Bom dia, porque no meio de
semana.
Realmente, estou recordando que a festa do aniversário do IGHB, no ano
passado, foi uma beleza. Muitos convidados, sócios, visitantes, homenageados,
condecorados com a Medalha Bernardino de Souza. Como sou “pidona” vou pedir uma
ajuda em dinheiro para ajudar nas despesas, que não são muitas, mas oneram a
Casa, ora em processo de mudança de rede elétrica, que o IGHB ganhou, da
Coelba, no “Faz Cultura”.
A Casa da Bahia completou 120 anos. Quis o acadêmico Cajazeira Ramos, da
ALB, fazer-lhe uma oferta muito especial. Arrecadou dinheiro, no que foi
criticado por algumas pessoas, incapazes de gesto semelhante. Obteve o dinheiro
para encomendar o bolo, como era do seu desejo. Um bolo de nozes gigante, que
ocupou o mármore inteiro da mesinha redonda antiga. Nem meus médicos podem
fazer previsões.
Penso que esse fato, relacionado com outras preocupações pessoais, fazem
com que, em plena madrugada, diria mesmo dormindo, acordo chorando
sentidamente.
Branca, a moça que me assiste, no período noturno, tenta me consolar,
usando palavras carinhosas de alento.
Aos poucos, vou respirando fundo, tentando debelar o choro reparador.
Choro que me alivia a alma e desafoga a mente, livrando-a de outras
interferências. Espero que as autoridades oficiais compareçam ou mandem seus
representantes. A festa dos 121 anos da instituição cultural mais antiga do
Estado deve merecer o apoio de todos os baianos. Por outro lado, no seu último
pronunciamento no IGHB, o representante do governador Jaques Wagner, Ubiratan
Castro de Araújo, declamou enfático ser a instituição “o verdadeiro Museu da
História da Bahia”.
Assim, serenamente, aquietada dos meus temores, vou, aos poucos,
retomando o sono e dragando a emoção.
Na manhã seguinte, acordo lépida e não parece que senti algo diferente
durante a noite de tristeza. Emoções genuínas são eficazes para a alma
cansada, cheia de sentimentos.
Quem me conhece sabe que sou um vulcão em erupção. As lavas que derramo
são águas escaldantes da minha “caldeira” interior. Pois, apesar de ser do
“grito” de Terra, Capricórnio, sou ígnea. Gosto do fogo e de suas vibrações.
Fazer o que se nasci assim?
O pranto da madrugada é uma válvula de escape. Penso ser necessário para
restabelecer o que foi “mexido”, bem fundo, bem dentro de mim. Traz de volta
tudo que tentei disfarçar, dissimular, para não fazer flutuar os meus
desapontamentos, as minhas decepções, as minhas frustrações.
Esse “pranto da madrugada” é algo que apareceu, há pouco tempo, no curso
dessa enfermidade. Se vai permanecer comigo, não sei responder. No momento
atual me traz muito alívio, disso tenho plena noção. Que fique, portanto,
comigo neste momento de tanto sofrimento e de dor.
Texto Publicado no Jornal A TARDE;