R. Santana
Encontrei Tanaguchi na Praça Olinto
Leone no aniversário de Itabuna. Se algum curioso me perguntasse quem é
Tanaguchi, lhe responderia que sei pouca coisa dele, não sei onde nasceu, não
sei onde mora, não sei para aonde vai nem quando vem, sei, apenas, que ele é
filósofo e sábio e pra mim, basta! Encontrei-o por acaso nessa praça absorto na
leitura de Platão e de lá pra cá, quando os acasos nos prendem, tomo-o por meu
guru e meu mestre.
Se além de curioso, esse alguém for
ardiloso, imputar-me a pecha de heterônimo, que Tanaguchi existe e não existe,
assim como Álvaro Campos, Ricardo Reis e Alberto Caeiro de Fernando Pessoa, que
Tanaguchi é um velho desocupado da Praça Olinto Leone, que o travesti de
filósofo e sábio, eu marcarei hora e local para que esse alguém conheça in loco
esse homem simples e cheio de conhecimento.
Naquele dia da cidade itabunense, sem
nada pra fazer em casa, lá na praça o encontrei:
- Bom dia, meu nobre representante da
escolástica do Século XXI! – provoquei.
- Não me provoque meu caro Narvil, este
honroso título pertence aos aristotélicos São Tomás de Aquino e Santo Anselmo.
Apenas, sou um leitor contumaz da filosofia grega, de Cristo, e, o tomismo...
Mas, homem de Deus, que faz aqui neste lindo Sol de 105 anos de Itabuna?
- Tirar umas caraminholas da cabeça...
- Hum!
- Foi o quê? Não acredita que estou
cheio de pensamento desgrenhado?
- Não!
- Posso saber a razão?
- Sua racionalidade!
- Eu sou mais coração... Você é razão!
- Bem, quais são suas caraminholas?
- O homem faz verso por necessidade
interior ou pra ser reconhecido?
- O poeta faz arte, quem não é poeta
faz verso!
- Oxente!... Poesia não é feita de
verso?
- Sim, mas nem sempre é arte!
- Explique!
- A arte é um canto da alma, os versos
vêm de dentro, só o poeta tem esse canto, quem não é poeta expressa versos sem
arte, livres, sem preocupação estética, mais erudição do que inspiração... –
fez uma pausa e completou:
- Hoje, todo mundo faz poesia!
- Meu caro Tanaguchi, se você condena
versos livres, então você condena, por exemplo, vates como Drummond e Mário de
Andrade?
- Narvil ó Narvil, não se atira pérolas
aos porcos, não se pode comparar o poeta do metafórico “No Meio do Caminho” e o
líder do Modernismo brasileiro com essa enxurrada de pseudopoetas que fazem
versos brancos e livres, ou seja, versos sem regras ou metade das regras, sem
mensagem nem conteúdo estético!
- O mesmo acontece com a prosa?
- Não tanto quanto a poesia. O romance,
pra começar, exige início, meio e fim. Além duma narrativa longa, vários
personagens, cada personagem com identidade própria, enredo articulado,
mistérios, suspenses, frases reticentes e habilidade do autor para conduzir o
leitor da primeira à última página. Enquanto se faz um soneto com 14 versos e o
poema, um pouco mais, a prosa é desenvolvida em dezenas de páginas, todavia,
prosa e verso não dispensam talento. Não é verdade Narvil?
- Sim! Mas, poesia e prosa são gêneros
diferentes, mas não significa que um é mais fácil do que o outro, ambos são
difíceis de elaborar, ás vezes, o mesmo autor tem mais aptidão pra prosa do que
pra poesia, ou, vice-versa!
- Concordo!
- Mas, acredita que a proliferação de
maus poetas é pela facilidade de produzir versos não convencionais, né?
- Sim!
- Justifique!
- Ó Zeus, proteja-me da fúria deste
questionador! Produzir textos com qualidade, não é fácil nem para o escritor
nem para o poeta, contudo, é muito mais fácil fazer um livro dessas poesias que
andam por aí, do que produzir um romance mesmo ruim, haja vista que aqui, um
famoso poeta, depois de publicar muitos livros de poesia, publicou, agora, seu
primeiro romance já na idade de descansar e produzir literatura... - deu-lhe uma tosse seca, depois que refez a
respiração, continuou:
- Acrescente-se que seu livro não teve
nenhuma repercussão na comunidade e não foi abençoado pela crítica. Portanto,
meu caro Narvil, eu não estou fazendo crítica graciosa, mas embasada em fatos,
a proliferação desses pseudopoetas é um fato inquestionável!
- Mestre Tanaguchi, romances e contos
ruins, também inundam as livrarias e os sites?
- Sim, mas o destino da subliteratura é
o lixo ou os sebos. A lei de Darwin também vale para literatura, o leitor ajudado
pela crítica é quem faz a seleção, porém, a literatura boa permanecerá sempre.
Faz-se necessário esclarecer que não existe detrimento entre a prosa e o verso,
ambos se completam. Alguns livros de prosa são verdadeiros poemas: qual a
diferença entre um poema e o Pequeno Príncipe de Antoine de Saint-Exupéry, O
Menino do Dedo Verde de Maurice Druon e os diálogos socráticos de Platão?
Nenhuma! Ou, a diferença entra a prosa e a obra poética, a epopeia portuguesa
Os Lusíadas do poeta Luís Vaz de Camões? – Não deixei que Tanaguchi
respondesse, pois de certa forma sabia sua resposta:
- Não existe diferença, mestre
Tanaguchi!...
Autor: Rilvan
Batista de Santana
Licença: Creative
Commons
(Site Recanto das Letras)