O Brasil
foi invadido por uma onda de salvadores da pátria e está caminhando para o
abençoado domínio dos humanistas de plantão, defensores das vítimas do hediondo
preconceito racial existente em nosso país, pior do que o movimento dos
sanguinários adeptos do Ku Klux Klan,
nos Estados Unidos e o apartheid da
África do Sul. A onda salvadora também pretende castigar os supostos homofóbicos, mesmo contrariando a
realidade dos divertidos desfiles
anuais, quando GLSs e Trans desfilam sem qualquer restrição, aplaudidos pelo
público e absolutamente livres para usar as vias principais das grandes cidades.
Em consequencia, começam a proliferar medidas “politicamente corretas”, na
contramão da atual legislação que permite o casamento civil e adoções aos que
optaram pela identidade de gênero e cria cotas nas faculdades para
afrodescendentes, mesmo antes de oferecer-lhes ensino fundamental e médio que
capacite ao ingresso no nível superior.
Lá vai o Brasil descendo a ladeira,
em plena faxina cultural que assustaria até Mao Tsé Tung. É um processo
comovente de proibição de termos indecorosos como “mulata”, “neguinha”, “negão”
e outras expressões presumivelmente usadas pela elite branca dominadora. No Rio
de Janeiro, segundo divulgado na imprensa tradicional e redes sociais, está
proibida a inclusão das marchinhas que tanto animavam os foliões, “Maria
Sapatão” e “Cabeleira do Zezé”, no repertório dos blocos de rua.
Quando a gente pensa que já viu
tudo, surge a notícia que o jovem e inteligente prefeito de Salvador, Bahia, Brasil,
sancionou uma lei municipal votada pela Câmara de Vereadores da Capital no mês de
dezembro, destinada a transformar o dia 20 de novembro em “Dia do empoderamento
do cabelo crespo”.
Ainda bem que a graciosa Taís
Araújo, casada com o baiano Lázaro Ramos, já estava “empoderada” à época em que
usava o cabelo com a aparência dos cabelos de todas as mulheres bonitas como
ela. Atualmente aderiu ao “esfarinhamento” da moda que torna as mulheres negras e mulatas
respeitadas e poderosas.
Afinal, o que é mesmo
“empoderamento”? Dizem os mais sabidos que o neologismo foi criado pelo
educador Paulo Freire, tem origem na
palavra empowerment do idioma inglês
e a partir de 2011 passou a aparecer nos
discursos de movimentos sociais. Diríamos que a idéia é dar a alguém ou a um
grupo o poder necessário à realização de mudanças de ordem social, política,
econômica e cultural no seu âmbito de atuação.
(agênciapatríciagalvão.org.br/mulheres-de-olho-2origem-do-conceito-de-empoderamento-palavra-da-vez/).
Ocorre que o “empoderamento” da
mulher afrodescendente ou de qualquer outra etnia, não está no cabelo mais
volumoso que a juba do leão africano e sim no conteúdo da caixa craniana, no
cérebro que comanda suas ações, prova seu valor e conduz a negra, a mulata, a cafusa,
a mameluca, a branca, homo ou hetero em sua preferência afetiva, a ser objeto
de respeito, admiração, sucesso e
aplausos.
O saudoso Sérgio Porto, mais
conhecido como Stanislaw Ponte Preta, diria que somos espectadores de mais um Festival
de besteiras que assola o país, um dos seus livros que contém a mistura de
protesto e humor. Apesar da lembrança amena do humor do Sérgio Porto, não é
possível evitar um comentário sobre o surto que
atingiu o mulherio já desfilando com o penteado da moda. Do mesmo modo,
como evitar a pergunta que insiste em brotar do FEBEAPÁ? Onde vai parar o “Brasil lindo e trigueiro,”
de Ary Barroso? O meu “Brasil brasileiro, terra de samba e pandeiro”? E onde
vamos ouvir Bororó, com seu samba lindo de morrer, “Da cor do pecado”? E a
minha gente bronzeada que é convidada a mostrar seu valor no ritmo do samba?
Acorda, minha gente! Somos um povo
lindo, diferenciado, mistura de etnias e culturas que nos transforma em espaço
único na Terra onde a cor da pele se mistura em relativa harmonia, vencendo a
mácula da escravidão. A mulata brasileira, rainha desse abençoado mosaico, já
foi consagrada pelos sambistas de raiz e demais compositores como a mulher
entre as mulheres, do “corpo moreno, cheiroso e gostoso” do verso de Bororó.
Para vencer o racismo vamos cantar
“assim já é demais/ eu não posso ficar
sem a nêga!”. Quanto à cabeleira do Zezé, ninguém vai cortar e ele ou
ela vão continuar “sassaricando” e “levando a vida no arame”, como todos os
brasileiros. E “Neguinho” da Beija-Flor, um
dos mais famosos puxadores de samba, vai continuar com o apelido
consagrado por seus admiradores. Como o tema é carnaval, não custa
aguardar a bateria da Mocidade
Independente de Padre Miguel e não mexer com a mulata que vai entrar na Avenida
Marquês de Sapucaí, levando o estandarte verde e rosa da Mangueira e dizendo
que é filha de Oyá.