PATRIMÔNIO HISTÓRICO E CULTURAL DE ITABUNA - Janete Ruiz de Macêdo




PATRIMÔNIO HISTÓRICO E CULTURAL DE ITABUNA

  
            *Janete Ruiz de Macedo


          A modernização das cidades condicionou um processo de destruição do patrimônio histórico-cultural, levado a cabo pela ação humana e legitimado, muitas vezes, por conceitos de progresso e desenvolvimento que tendem a excluir a fruição cultural das comunidades.
          Esse processo tem afligido sobremodo os povoados e vilas que surgem inopinadamente, crescem em processo acelerado e, rapidamente, tornam-se cidades para em seguida transmudarem-se em polos regionais, a exemplo de Itabuna.
          A cidade foi expandindo o seu corpo, a início tortuoso, de casas de tetos de zinco em ruas de areia fina que margeavam o rio para mais tarde tornar-se o concreto e argamassa e espraiar-se ao longo do rio Cachoeira, galgando colinas, avançando, abrindo espaço através dos campos que a circundam.
          Já vai longe o tempo que se podia ouvir o tilintar sonoro do peitoral festivo das madrinhas das tropas estimuladas pelo estalar agressivo do chicote, o apito estridente do trem que convocava aqueles que partiam para Mutuns ou Ilhéus ou ainda a rouca buzina das marinetes pertencentes à Viação Sul Baiana que desbravavam as estradas lamacentas das terras do cacau.
          Os anos passaram depressa… O roncar estridente dos carros, ônibus, motos e caminhões, as buzinas insistentes, os agudos apitos a disciplinar o congestionado vai e vem, os sons intermitentes dos anúncios, as rádios e televisões enchendo o espaço e violentando o silêncio das coisas. Por toda parte o agitar constante, o comércio trepidante, a circulação de riquezas na pressa de crescer, de somar prosperidade.            
          O frêmito de modernização percorre a sociedade itabunense, fazendo-a esquecer os traços definidores de sua identidade. Aos poucos seu patrimônio histórico-cultural vai sendo dilapidado, a estandardização de valores gerados pela massificação e globalização substituem as particularidades locais.
          Algumas poucas vozes levantam em espasmos longínquos a bandeira do preservacionismo. Mas, defender patrimônio é, antes de tudo, conhecê-lo. E conhecer o patrimônio implica conhecer o percurso histórico em que ele se enquadra e fora do qual perde todo o significado.
          A história é esse fio que busca fundamentalmente compreender e viver o presente através da observação do passado, permitindo-nos encontrar formas corretas de movimentarmo-nos no espaço e no tempo em que vivemos.
          Não há dúvida de que as realidades patrimoniais são instrumentos preciosos para o estabelecimento do diálogo com o passado. Elas se impõem pela intensidade de sua presença concreta, colocam-nos em comunicação direta com ele. Qualquer racionalização do passado é  codificada por um sistema de referências dependentes da interceptação de vários discursos sobre as realidades vividas pelos nossos antepassados. Ora, o patrimônio assume o papel relevante e insubstituível enquanto referencial observável que permite obter respostas para muitas questões relativas às sociedades que nos precederam permitindo ao indivíduo confrontar-se com as realidades pretéritas e encontrar pistas para a compreensão do seu próprio tempo.
          Onde estão esses referenciais em nossa cidade? O que foi feito dos nossos marcos identificadores?
          Antes de prosseguir, seria interessante lembrar que a UNESCO tipifica os bens patrimoniais imóveis em: monumentos, conjuntos e sítios. 
          Por monumentos entende-se não só as obras de arquitetura e composições importantes como também criações mais modestas, notáveis pelo seu interesse histórico, arqueológico, artístico, científico, técnico ou social, incluindo instalações e elementos decorativos que delas fazem parte, bem como obras de escultura ou pintura monumental. 
          Os conjuntos são definidos como agrupamentos arquitetônicos, urbanos ou rurais, de suficiente coesão, de modo a poderem ser delimitados geograficamente, e notáveis, simultaneamente, pela sua unidade ou integração na paisagem pelo interesse histórico, arqueológico, artístico, científico, técnico ou social.
          Quanto aos sítios, são obras do homem e da natureza, espaços suficientemente característicos e homogêneos, igualmente notáveis pelo seu interesse quer histórico, arqueológico, artístico-científico, quer social.
          O lato conceito de patrimônio legalmente consagrado está, portanto, muito longe da tradicional ideia de que só os grandes monumentos têm significado histórico. É hoje possível e desejável integrar no patrimônio cultural não apenas os produtos da cultura erudita, mas também a herança cultural popular, traduzida em inúmeras manifestações e objetos com que cotidianamente nos deparamos.
          Pensando como a UNESCO, resta-nos ainda muita coisa a preservar e defender. É tempo de repensar Itabuna e este refletir passa antes de mais nada pela educação, pela sensibilização das jovens gerações, tornando-os cidadãos conscientes de sua identidade e defensores da memória coletiva regional.
          Diante desta constatação e compreensão a Universidade Estadual de Santa Cruz não pode omitir-se na busca das raízes, da concepção e das formas de expressão da comunidade que a construiu e constrói e vem desenvolvendo o Projeto Levantamento do Patrimônio Histórico-Cultural da Área de Inserção da Universidade Estadual de Santa Cruz do qual apresentamos o relatório referente aos estudos desenvolvidos na cidade de Itabuna.

  
*Janete Ruiz de Macedo é doutora em História, historiadora e membro da ALITA