O FASCÍNIO DA VERDADE







                                    O FASCÍNIO DA VERDADE

                                                               Sônia Carvalho de Almeida Maron*

            Existem frases feitas, axiomas, provérbios, aforismas,  pensamentos de pessoas famosas, seja qual for o nome atribuído, que penetram em nossa mente e ficam gravadas para sempre. É aconselhável, nesses casos, a bem da ética e da lisura, proclamarmos a origem, ou seja, a referência, para evitarmos o plágio, prática deletéria que deve ser combatida a qualquer preço, por quem se aventura a publicar o que diz escrever. Quero referir-me a uma expressão que ouvi ou li não sei onde, e a esta altura da vida a origem está perdida na névoa do tempo. Não sei se ouvi quando sentava nas carteiras do Ginásio Divina Providência ou  nos agradáveis e iluminados serões da casa de Valdelice Pinheiro, ainda adolescente;  poderia ter ouvido, talvez, nos inflamados discursos de Wilde Oliveira Lima que atraia público considerável e estudantes do Divina Providência nas sessões de júri do antigo Forum da rua  Barão do Rio Branco. Os debates daquela época, tendo Wilde ou seu irmão Waly como titulares da acusação, serviram para os estudantes ouvintes que enveredaram pelo mundo do Direito, como antecipação das mais brilhantes aulas de Direito Penal. Em verdade, quero referir-me à frase de Victor Hugo, escritor do romantismo francês, “a verdade é como a túnica de Cristo: não tem costura”. Eu nunca fui à Terra Santa e nunca vi o Santo Sudário. Dizem que não tem costura.
        O mesmo acontece com algumas reportagens e entrevistas que de vez em quando aparecem nas revistas ou jornais de maior circulação no país. Quando espelham a verdade, não devem ser encaradas com preconceito, venham estampadas nas páginas das revistas Veja, Carta Capital, Caros Amigos, Época, Isto é, Cláudia, Caras etc. etc., passando pelos jornais Folha de São Paulo, Estado de São Paulo, O Globo, A Tarde, como amostragem, sem esquecer nossos Diário Bahia e Agora. A verdade é a verdade. Sem costura, sem remendos ou explicações rebuscadas e amenas para confundir os menos avisados. Raridade. Apanágio dos corajosos e independentes. A verdade não é uma colcha de patchwork montada por costureira que não sabe cortar os retalhos, combinar tamanho, cores e estampas, sem comprometer a beleza da peça. É ética e até estética. Pura e transparente.
        A verdade também incomoda, revolta, irrita, cria desconforto. É preciso grandeza para refletir e aceitá-la pacificamente. Aceitando-a, serve de poderoso antídoto  ao veneno inoculado na vida social pelo engodo e busca de aprovação “buscando cargos não para servir à sociedade, mas para se servir dela”. As aspas identificam palavras do Ministro Marco Aurélio de Mello, 24 anos no Supremo Tribunal Federal , atual presidente do Tribunal Superior Eleitoral (exercendo o cargo pela segunda vez) em entrevista concedida à revista Veja, páginas amarelas da edição nº 2360, de 12 de fevereiro de 2014. Merece ser lida, guardada como o pensamento de um jurista e mensagem de alerta de um cidadão. 
        Tive a satisfação de conhecê-lo, no exercício do cargo de presidente da Suprema Corte, em um Congresso Nacional de Corregedores da Justiça, ao qual compareci como juíza auxiliar, assessora da Desembargadora Celsina Moreira Pinto da Rocha Reis, hoje aposentada, que marcou sua passagem na Corregedoria com a postura invulgar de magistrada elegante nos gestos, na aparência, no humanismo, no exercício da função judicante como meio de servir aos jurisdicionados. Resumindo, a desembargadora em tela pertence à espécie em extinção que nunca disse  ou pensou em dizer: “sabe com quem está falando?” Ela desconhecia a frase simplesmente porque fazia a diferença.
        Lembro a ex-desembargadora do TJ-BA, escrevendo sobre o ministro do STJ e presidente do  TSE, porque se assemelham na elegância em sentido mais amplo, na lhaneza que identifica pessoas de fino trato. O Ministro que dizem polêmico e que os críticos tentam, sem êxito, ofuscar o brilho, atribuindo-lhe a alcunha de “ministro do voto vencido”, incomoda e é invejado. Incomoda, com certeza, a aparência do carioca elegante, de gravata italiana, passando pela abotoadura na camisa de punho duplo e colarinho perfeito, terno de corte perfeito, sapato impecável; são detalhes que constituem o invólucro do jurista de palavra fácil e erudita, temperada com a discreta ironia de quem sabe o que diz sem jactar-se do saber. Anfitrião requintado, recebeu seus colegas magistrados no início da rampa do STJ. Deixando de lado os detalhes materiais de sua aparência, deve ser ressaltado o alerta do Ministro para o óbvio: a necessidade de homens públicos que cumpram as normas já existentes e o desgaste institucional decorrente dos ataques ao Ministério Público, Poder Judiciário e liberdade de imprensa. Em resumo, o que define  o perfil do Presidente do TSE, comandante-em-chefe do processo eleitoral, é sua resposta a uma das perguntas do jornalista Otávio Cabral:”. “O que busco até hoje, e já estou há 35 anos julgando, é a paz com a minha consciência.” 


*Presidente da Academia de Letras de Itabuna – ALITA 
Juiza de Direito aposentada do  TJ-BA